quinta-feira, 19 de abril de 2012

Renato renova o amor pela vida e pelo Flamengo: 'Venci uma batalha'

Por Richard Souza Rio de Janeiro
 
renato abreu flamengo   (Foto: Richard Souza/Globoesporte.com)
Renato distribui autógrafos na Gávea
(Foto: Richard Souza/Globoesporte.com)
De três em três passos, Renato tentou caminhar de uma das piscinas da Gávea até o vestiário dos jogadores do Flamengo. Há tempos ele não passava por ali. Há mais de um ano não sentia tanto carinho. Incontáveis fotos e autógrafos. Sorrisos para adultos e crianças. Renato sorri como uma delas. Brinca como um moleque. Depois do treino da tarde desta terça-feira, deu “caldos” em Negueba.

Aos 33 anos, o meia sente-se mais jovem. O coração bate mais forte e emocionado. Há quase um mês e meio, ele temeu que tudo isso parasse. Num exame de renovação do seguro de saúde, um teste ergométrico apontou o que ele não esperava: o ritmo dos batimentos cardíacos não estava normal. Uma arritmia do tipo mais grave, com risco de morte, o afastou dos treinos e jogos. Tempo indeterminado. Tempo para pensar.

- Talvez tenha sido a primeira vez que algo colocou em dúvida a continuidade da minha carreira. Foi um momento que realmente me fez pensar em parar.

Decidiu que não era a hora. Conversou com os médicos do clube, se agarrou na esposa Karina, nas filhas Karen, Rebeka e Renata, que ainda estava na barriga, nos amigos, na fé e nos fãs.

- Mesmo em casa eu sentia isso, a torcida tinha um carinho enorme nas manifestações na internet, torcedores de outros times, pessoas que já passaram por esse tipo de cirurgia. Isso acaba motivando cada vez mais. Com tanto tempo de futebol, acabei sentindo isso agora e não sei o tamanho do carinho que os torcedores têm por mim.
A cirurgia corrigiu o problema. Daí em diante, paciência e trabalho. Renato voltou na último domingo, na vitória por 3 a 1 sobre o Americano, pela Taça Rio. Foram pouco mais de 15 minutos que mais pareceram uma conquista de campeonato.

- Foi como ganhar um título com o Flamengo. Como se fosse o primeiro jogo de quem acabou de subir para o profissional.
renato abreu flamengo   (Foto: Richard Souza/Globoesporte.com)
O camisa 11 do Flamengo faz com as mãos um coração (Foto: Richard Souza/Globoesporte.com)
 
No bate-papo no estacionamento da Gávea, Renato disse ao GLOBOESPORTE.COM que quer jogar até a Copa do Mundo de 2014. Em forma de pedido, disse o mesmo para a presidente Patricia Amorim quando ela o visitou no hospital. Só quer parar depois de jogar no novo Maracanã e conquistar um título no estádio pelo Flamengo.
- Essa renovação do meu coração me tirou dos 33 anos e me trouxe para os 29 (risos). Tenho mais três, quatro anos, para poder jogar no futebol.
Abaixo, a íntegra da entrevista:

Em algum momento, nesse período que enfrentou o problema no coração, você temeu perder esse carinho? Temeu ter que abreviar a carreira?

A gente sabe que futebol é passageiro. Você tem de 15 a 20 anos de profissão, passa rápido. Tem sempre que aproveitar o momento. Não o momento só de glória, mas todos que acontecem na nossa vida dentro do futebol. A situação que ocorreu comigo foi delicada, uma coisa que jamais desejaria nem para um inimigo. Uma coisa ruim, ainda mais para um jogador de futebol. Graças a Deus eu me recuperei e voltei. Nesse período parado, um mês e pouco, foi bom para refletir muitas coisas e sentir o que nos faz falta. O jogador é movido pelo carinho do torcedor. Mesmo em casa eu sentia isso, a torcida tinha um carinho enorme nas manifestações na internet, torcedores de outros times, pessoas que já passaram por esse tipo de cirurgia. Isso acaba motivando cada vez mais. Com tanto tempo de futebol, acabei sentindo isso agora e não sei o tamanho do carinho que os torcedores têm por mim.

Apesar de estar há tanto tempo na profissão e de os médicos terem tranquilizado você desde o início, foi o golpe mais duro que sofreu até hoje?
Foi. São muitos anos de futebol, mas talvez tenha sido a primeira vez que algo colocou em dúvida a continuidade da minha carreira. Foi um momento que realmente me fez pensar em parar. Mas como eu tive a felicidade de ligar para os médicos logo após o exame, perguntei qual era a possibilidade de voltar e eles disseram que era grande. A todo tempo vinha aquele filme, saber se jogaria ou não. Passou um filme na cabeça sobre tudo que aconteceu com outros jogadores, o caso do Washington (ex-Fluminense) também, do Serginho (ex-São Caetano, morto em 2004), os casos mais recentes. Me perguntava: será que você vai voltar a jogar? Mas é passageiro. Estou muito bem psicologicamente, a família me deixou muito tranquilo. Meus pais, minha esposa (Karina), minhas filhas (Karen, Rebeka e Renata – de um mês). Amigos me deram força muito grande. São coisas que alimentam. O que aconteceu faz parte do passado. É pensar para frente.

Fez questão de contar para suas filhas?

Minha preocupação era a notícia, que é dada rapidamente. Antes de falar com meus familiares a notícia chegou pela imprensa. Tomei um susto por não ter dado a notícia para os meus pais, que são pessoas de uma certa idade. Eles acompanharam pela internet. Minha esposa estava para ganhar neném e tinha também as outras duas filhas. A mais velha (Karen, de 9 anos) entende um pouquinho mais, viu minha foto com a imagem de um coração no site e perguntou o que era. Fui explicando aos poucos. Acabei pegando a alegria dela e não passando tanta preocupação. Usei aquilo para ela me ver mais rápido em campo.

Você disse que foi a primeira vez que pensou em parar. Se tivesse de interromper a carreira, estaria realizado?

Eu tenho muitos objetivos, metas pessoais. Mesmo com 33 anos. Com essa idade, 15 anos de futebol profissional, me sinto bem realizado, não me arrependo de nada. Foram momentos brilhantes que passei em outros times e aqui. Os melhores foram aqui no Flamengo e no Corinthians. Me sentiria realizado, mas não totalmente. Se fosse com 23, 25 anos, início de carreira, seria ruim pensar em parar, ainda mais dessa forma. Mas os objetivos que tracei no Flamengo eu consegui todos. Ano passado, tinha um muito grande, que era ser campeão invicto, e consegui ganhar. Ganhei o prêmio de melhor segundo volante também. Digo que essa renovação do meu coração me tirou dos 33 anos e me trouxe para 29. Tenho mais três, quatro anos, para poder jogar no futebol.
renato abreu flamengo   (Foto: Richard Souza/Globoesporte.com)
Renato posa com pequeno fã após treinamento na Gávea (Foto: Richard Souza/Globoesporte.com)
Sentiu algum receio na volta? Na hora de entrar, à beira do campo, o que pensou?

A ansiedade veio. Desde o momento em que vi o meu nome na lista. Ela aumentou quando entrei no vestiário, a concentração, trocando de roupa, oração no túnel. A ansiedade aumentou também porque acho que foi a primeira ou a segunda vez que fiquei no banco pelo Flamengo. Veio o segundo tempo, fiquei na ansiedade para aquecer, perguntando o tempo de jogo. Entrei no fim, a coisa tem que ser gradual, os 15 minutos (entrou aos 28 da segunda etapa) foram tranquilos, senti os gritos sinceros de quem estava lá. Por mim jogaria o tempo todo, mas o Joel (Santana) preferiu colocar durante o jogo. Aos poucos as coisas vão melhorar, temos a semana toda para trabalhar e evoluir.

Foi uma emoção parecida com o quê?
Foi como ganhar um título com o Flamengo. Saber que a torcida está apoiando. Como se fosse o primeiro jogo de quem acabou de subir para o profissional. Vem ansiedade, incerteza, se vou sentir algo ou não, se vou errar um passe. Tudo foi renovado. A cabeça é a mesma, mas as dúvidas vão existir. Naquele momento, foi uma glória.

O que você quer fazer até o fim do contrato com o Flamengo?

Tenho um carinho enorme pelo Flamengo. Se pudesse ficaria pelo resto da carreira. Me sinto em casa, feliz. Fico no lugar onde me sinto feliz. Quero jogar até a Copa do Mundo (de 2014). Qualquer jogador que joga aqui quer ser campeão. Vou procurar cumprir meu contrato até o fim do ano e, se possível, conquistar um título. É o que eu quero para o fim da minha carreira.

É um campeão da vida?

Não tem esse título, né? Mas esse título é pessoal, saber que venci uma batalha. Não foi tão difícil, mas foi pessoal. Só eu sei o que senti na cirurgia, nesse mês e meio que fiquei distante. Agradeço o apoio que me deram. Serviu de motivação para voltar mais rápido.

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