sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Parceria com Maradona, idolatria por Zico, estilo de Neymar, boiadeiro de jegue: os ‘causos’ de Jacozinho

Parceria com Maradona, idolatria por Zico, estilo de Neymar, boiadeiro de jegue: os ‘causos’ de JacozinhoEXCLUSIVO: Trinta anos depois de ter feito história no Maracanã, ao marcar um gol com passe de Maradona, o ídolo do CSA conversou com a Goal Brasil
Zico estava de volta ao Flamengo, após dois anos no futebol italiano com a Udinese. A celebração rubro-negra seria em grande estilo, com um amistoso entre o clube carioca e um time composto por craques, todos amigos do Galinho. Entretanto, como acontece em toda festa, apareceu um ‘penetra’. E ele conquistou todos e entrou para a história do Maracanã ao deixar o banco de reservas substituindo Paulo Roberto Falcão e marcando, com assistência de Maradona, o único gol dos ‘Amigos’ na derrota por 3 a 1 para o Fla.

Um craque de nível mundial, com certeza titular em algum dos 12 grandes clubes brasileiros ou do futebol europeu, você, que não conhece a história, deve estar pensando. Mas tratava-se de Jacozinho, ponta do CSA de Alagoas, que à época era um dos grandes protagonistas das carismáticas reportagens de Márcio Canuto. Folclórico, porém com sua dose segura de habilidade, o ídolo do Azulão ganhou o Brasil com o seu estilo e o insistente sonho de defender a Seleção Brasileira.
Em bate-papo exclusivo com a Goal Brasil, Jacozinho contou como foi parar no banco de reservas do técnico Telê Santana naquele amistoso realizado há 30 anos; exalta Zico, fala sobre um convite que recusou de Maradona; cantou música, relembrou de quando entrou em campo montado em um jegue e dos tempos em que ‘voadora’ era permitida no futebol. Jacozinho não titubeou para comparar o futebol por ele jogado com o de Neymar e cravou: se jogasse atualmente, teria vaga no Barcelona e na “Seleção do Mundo”. Confira a conversa com o ex-jogador, que também falou sério na hora de lembrar as dificuldades passadas em sua vida.
Goal Brasil: Dias antes do amistoso, você contagiou a torcida do Vasco comentando uma partida do clube no Maracanã. Como foi que isso aconteceu?
Jacozinho: “Eu cheguei no Rio, e aí o empresário me levou para um hotel na Cinelândia... e eu que ia pagar tudo, né? Aí deixamos nossas bagagens lá e fomos para o Maracanã. Chegando lá, o empresário me levou para a cabine da Globo, com o nosso amigo e irmão Washington Rodrigues, o Apolinho, José Carlos Araújo... aquele pessoal todo que estendeu a mão para mim naquele momento. E, quando eu estava lá comentando aquele Vasco contra Bangu, a torcida do Vasco veio toda para baixo da cabine e começou a gritar: ‘Jacozinho! Jacozinho! Jacozinho!’. O José Carlos Araújo disse que eu tinha muita moral Brasil afora. Foi aí que começou a caminhada para eu participar do jogo do Zico”.
Jacozinho tentou, mas não conseguiu defender oficialmente a Seleção. Mas ele garante: teria vaga na "Seleção do Mundo" (Foto: Reprodução/Placar)

Mas quando você chegou no Rio o pensamento já era participar do jogo do Zico. Como você acabou entrando em campo?
“Olha, aquele jogo foi muito em cima da hora. Eu ia jogar contra o Atlético-MG (pelo CSA) e, quando eu cheguei lá, tive a visita desse empresário que até hoje eu não sei quem é. E aí, o que aconteceu: ele perguntou se eu queria participar deste jogo. Aí eu falei que queria sim, quem não ia querer? Ele disse que eu ia ter que ver a passagem e hospedagem... e eu falei: ‘aí, pegou’. Um diretor que estava do meu lado disse que passaria um vale para mim, porque seria o jogo da minha vida. E eu fui. Foi assim que eu cheguei lá no Maracanã”.
Além do gol, qual é a sua principal lembrança daquele dia?
“Aonde ficava o banco, era alto para mim. Então eu tinha que ficar em cima de uma bola, para ficar olhando gente ali na grama. E aí todo mundo foi entrando no jogo e minha ansiedade foi crescendo, eu fiquei muito nervoso. Tremia muito. Aí ficou eu e um zagueiro que estava indo para o Vasco, lá do Uruguai, Paraguai... um negócio desses. A torcida começou a gritar o meu nome, e quando eu percebi era o Maracanã inteiro gritando. Chegava a balançar o estádio. E aí, meu amigo, eu comecei a tremer, tremer... o Telê (Santana) virou e disse: ‘O que está acontecendo? Você está tremendo!’, e eu só respondi: ‘nada, professor, eu tô é aquecendo!’
Aí ele disse: ‘já que você não está com medo, vai entrar no lugar do Falcão’. ‘No lugar de quem, professor?’, perguntei. E aí eu fui, já pensando o que eu estava fazendo naquele lugar. Só tinha fera, jogador de fora, tudo consagrado. Quase que eu volto em cima de uma bucha, de tão nervoso que eu estava.
O que você pensou logo após fazer um gol com passe do Maradona? Ele chegou a falar alguma coisa para você?
“O Maradona meteu a bola entre os zagueiros, eu entrei em diagonal e fiz o golaço. O gol do jogo, né? Um golaço! E esse gol deu até música, viu? Um pagodezinho que fala assim: ‘Maradona lançou, Jacozinho partiu;  Figueiredo ficou, Caaaaaantarelli caiu!; E a torcida gritou é goool de Jacozinho! É gol, é gol... É GOL! É gol, é gol, de Jacozinho; É gol, é gol... É GOL! Foi assim que a torcida gritou’. 
Depois do gol foi Maradona, Júnior, Nunes, Paulo, Zico, Alemão... a rapaziada toda correu lá no pau da bandeira. E eu me lembro bem que o Maradona ficava gritando “GOL, GOL, GOL, GOL”. Era só aquilo que eu entendia ele falar, né? Depois, no vestiário, ele me convidou para uma boate para comemorar. Mas eu não fui; acabei indo para um coquetel lá na festa do Zico".
Maradona e Zico desejam ser presidentes da Fifa. Se você pudesse votar, escolheria qual deles?
“Duzentos milhões de vezes, o Zico. O Zico é o cara certo. Naquela época da festa do Zico, eu não tive muita aproximação com ele, até porque foi muito conturbado aquele negócio. Mas há vinte dias atrás eu estive no Rio, falei com ele no CT. O Zico é uma pessoa formidável, fora de série. Já era meu ídolo, agora passou a ser muito mais. Eu conversei com ele, e agora em janeiro vamos ter uma festa de nível mundial, porque vai ser o reencontro dos ídolos, dos monstros do futebol: Jacozinho e Zico, lá em Maceió. E ele falou comigo que eu poderia divulgar, porque da parte dele já estava fechado”.
Evaristo de Macedo, técnico do Brasil na época, disse que você precisava ter jogado por um clube de maior expressão para ter ido para a Seleção. Chegou a negociar com algum clube destes?
“No período do auge, logo após aquela festa do Zico, eu estive cogitado em quase todos os clubes do Brasil. Inclusive o Botafogo. O Agnaldo Timóteo (cantor, conhecido botafoguense) mandou recado dizendo que ia fazer vários shows para arrecadar fundos, porque ele queria Jacozinho no Botafogo, porque tinha uma semelhança com Mané Garrincha. E ele queria que Jacozinho fosse pra lá. E eu passava todas as noites ouvindo o rádio, esperando que um clube me contratasse. Mas não aconteceu, e aí eu fui vendido para o Santa Cruz”.
Você já entrou em campo montado em um jegue. Como foi essa história?
“Foi no Rio Grande do Norte. Um repórter me perguntou se eu toparia entrar no clássico de jegue. Eu perguntei como iam fazer aquilo, e ele tomou conta das coisas. E aí eu falei: ‘rapaz, tem que ser um jegue grande’, porque eu era meio gordo, né? Tem que ser grande, senão não vai dar. E foi feito. Nós conseguimos entrar, mas a torcida foi toda abaixo, meu amigo: todo mundo gritando, aquela coisa toda. Só que tiveram uns filhos de Deus lá que soltaram rojão... agora você imagina, né? Quando começou o pipoco a tocar, o burro começou a dar coice, e saiu correndo e jogou nós dois no chão. Foi uma agonia, mas o pior não foi pra levantar do chão: foi pra tirar ele de campo”.

Do que você sente falta no futebol atual?
“A ousadia do futebol brasileiro acabou. Hoje não tem um jogador que resolve o jogo dentro de campo. É mais coletivo. Antigamente também era coletivo, mas como o futebol precisa de um jogador para resolver, naquele tempo tinha. Hoje, não. Você fica à mercê da velocidade, do jogo truncado, do jogo em que antes de receber a bola os caras já estão te empurrando e calçando o seu calcanhar. Então ficou demais! 
Hoje você não tem um jogador habilidoso que pegue a bola e drible, igual eu fazia. Não tem mais! Então fica assim, uma seleção como a nossa precisando só de um jogador, como o Neymar. Neymar é um craque, um maestro do futebol. E se não tem o Neymar, a Seleção não anda. Então nós precisamos fazer jogadores como antigamente. E dá para fazer! É só mudar as atitudes dos jogadores, professores, treinadores, do pessoal do comando técnico... Acabou o futebol brasileiro”. 
Jacozinho se identifica com Neymar, mas sente falta do futebol de antigamente (Foto: Reprodução/Facebook)

Você se identifica com qual jogador do futebol atual, e acha que jogaria em qual clube nos dias de hoje? 
“Eu tinha o mesmo estilo do Neymar: partia pra dentro, driblava... só que naqueles tempos a gente podia fazer alguma graça. Hoje em dia não pode mais. Hoje em dia, se você tem um dom que Deus te deu você não pode mais usar, porque é desmoralizar os outros. Naquela época a gente levava pancada, tapa no rosto, mas também a gente fazia muita coisa. No CRB, tinha um marcador, o Carlinhos, que ele dava muita pancada. E eu gostava de dar drible nele. Teve uma vez que ele me deu uma voadora, porque voadora antigamente podia, só que eu toquei a bola num lado e busquei no outro. Aí fui para a trave e subi em cima da bola, antigamente a trave era de madeira mesmo. Aí eu subi em cima da bola e fiquei chamando ele”.
Qual clube você acha que teria vaga nos dias de hoje?
“Se for em time do Brasil, hoje tá difícil... só um Corinthians. Naquela época era Flamengo, Vasco, os times do Rio. Se jogasse nos times do Rio, era Seleção Brasileira. Hoje, não. Hoje está difícil. Se fosse lá fora, seria o Barcelona”.

Você passou por dificuldades na sua vida, após pendurar as chuteiras. Se tivesse que dar um conselho para você mesmo no passado, qual seria?
“Eu tive altos e baixos, tive uma vida muito boa quando eu estava no auge. Tive fazendas, casas, vários apartamentos. Quis o destino que eu perdesse tudo. Hoje eu sou um servo do Senhor, sou evangélico há 21 anos já. Aceitei Jesus e minha vida mudou ali. No fim de carreira eu fiquei morando embaixo de uma arquibancada, no Maranhão. Mas foi lá que eu encontrei Jesus e foi lá que Deus mudou toda a minha história. E hoje eu sou um cara que dá palestras, viajo o Brasil pregando e dando testemunhos. Dou palestras para clubes, para jogadores de base, e falo para eles: você tem que ser humilde, sempre humilde. É assim que o ser-humano tem que ser. Se todos tivessem essa mentalidade da humildade, o mundo não seria como é hoje”.
Se você jogasse hoje, teria vaga na Seleção Brasileira?
“Eu teria na Seleção do mundo”.

Tauan Ambrosio

@ambrosiotauan 

RJ

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