quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Rubro-negro na floresta: paixão pelo Flamengo começa através do rádio

Por Xapuri, AC

Quão longe um time pode ir? De acordo a última pesquisa de torcidas, da Pluri Stochos Pesquisas e Licenciamento Esportivo, divulgada em março de 2013, a torcida do Flamengo corresponde a 16,8% da população brasileira. José Ribeiro da Silva certamente não foi alcançado pelos pesquisadores, mas diz fazer parte com orgulho dessa estatística. Ele é um seringueiro de 39 anos, que vive na Reserva Extrativista Chico Mendes, no município de Xapuri, interior do Acre.
seringueiro josé ribeiro flamenguista (Foto: Yuri Marcel/G1)
Hoje, José Ribeiro acompanha jogos pela televisão (Foto: Yuri Marcel/G1)
Para chegar na casa dele é preciso pegar uma estrada de terra que vai se transformando em mata quase fechada a medida em que se entra na Reserva. Mesmo de caminhonete, o trajeto leva cerca de uma hora e no período de chuvas ainda é preciso enfrentar a lama que se forma no percurso.
O futebol, fazendo jus ao status de paixão nacional, não se intimidou pelo isolamento da floresta e encontrou José dentro do seringal. E ele se tornou flamenguista, antes mesmo de ver o time em ação. Sem imagens, ele ainda garoto fantasiava como seria o time.


- Acompanhávamos as partidas pelo rádio, na época não existia televisão nem mesmo na cidade. Comecei a gostar do Flamengo e me tornei flamenguista de coração. Eu imaginava como era. Às vezes a gente via alguma blusa do Flamengo e tinha alguma noção - conta.

Ele diz não lembrar muito da primeira vez que viu o Flamengo jogar, mas recorda de ter se emocionado. No seringal moderno tem televisão e parabólica, e os aparelhos eletrônicos funcionam a bateria. Na sala, em lugar de destaque fica a TV e ao lado um escudo do Flamengo feito em madeira pelos filhos do seringueiro.
Segundo José, a família não tem muito tempo para acompanhar os jogos, mas sempre assistem as partidas transmitidas às quartas-feiras e domingos. Mas dia de clássico na casa de quatro cômodos é sagrado. Clássico é claro, significa jogo entre Flamengo e Corinthians. Isso porque  José, os dois enteados e a filha são flamenguistas. Já a mulher dele, um sobrinho e um amigo que também vive na casa são corintianos.  
- O Corinthians aqui é sempre minoria, mas quando ganham gozam dos flamenguistas - conta bem humorado.
 E assim os dias passam no seringal de onde José não pensa em sair.
- Pretendo permanecer até o fim da minha vida se possível - completa o flamenguista da floresta.

Chico Mendes e 'empate': seringueiro defendeu a floresta
O pai dele era nordestino e como milhares da região foi para o Acre trabalhar como seringueiro na esperança de uma vida melhor. Silva como tanto outros Silvas país afora começou a trabalhar cedo, aos 12 anos, e seguiu a profissão do pai.
seringueiro josé ribeiro flamenguista (Foto: Yuri Marcel/G1)
José Ribeiro seguiu os passos do pai e também é seringueiro (Foto: Yuri Marcel/G1)
Ele chegou até mesmo a conhecer o líder seringueiro Chico Mendes, assassinado em 1988, e a participar de um 'empate', como eram chamadas as manifestações realizadas pelos seringueiros para impedir que fazendeiros derrubassem as florestas durante as décadas de 1970 e 1980 no Acre.
- Foi na Fazenda Siberana. A gente foi para lá e paramos com a derrubada. Encaramos inclusive a polícia que estava ao lado do fazendeiro - relembra.
Hoje a situação mudou, os conflitos entre fazendeiros e seringueiros não ocorrem mais no interior do Acre e José Ribeiro vive em sua área da coleta de látex que vende para a Natex, fábrica de preservativos masculinos instalada em Xapuri. Por esse serviço ele ganha cerca de R$ 800 por mês. 
- Não é bom, mas dá para se manter - comenta.

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