sábado, 8 de novembro de 2014

Perseguido por militares e não pelos zagueiros, irmão de Zico lança livro

A família Antunes Coimbra, cujo expoente maior é Zico, não se resume ao Galinho de Quintino quando o tema é futebol. Antunes, o primogênito e ex-centroavante do Fluminense, e Edu, considerado por muitos o maior jogador do América, também compõem a constelação. Mas outro habilidoso craque da família não pôde ter sua técnica reconhecida nacionalmente. Embora seus dribles não tenham ganhado notoriedade pelo Brasil afora, a exemplo dos irmãos foi perseguido e até hoje sente as marcas das pancadas que levou de seus mais implacáveis marcadores. Não eram zagueiros brucutus, mas sim arapongas do golpe militar, decretado em 1º de abril de 1964. Trata-se de Fernando Antunes Coimbra, o Nando. E neste sábado, às 12h, no Grêmio Esportivo Vital, em Quintino, lança o livro "Clube dos vitalícios".
"Clubes dos Vitalícios" reúne histórias vividas por Nando em Quintino (Foto: Divulgação)
"Clube dos vitalícios" reúne histórias vividas por Nando em Quintino. A capa retrata uma pelada da qual ele e o irmão fizeram parte. Nando é o de calção preto, disputando a bola. Zico, de short branco, está no gol (Foto: Divulgação)


"Clube dos vitalícios" reúne casos presenciados pelo autor em Quintino, bairro onde mora até hoje. Há uma pitada de ficção. Ilustrações e poemas também são assinadas por ele.
- É comum depois das peladas o papo interminável dos peladeiros. Começa com comentários e discussões da pelada terminada e, a partir daí, fala-se de tudo: de mulher, de casos hilariantes, de mulher, do dia a dia, de coisas engraçadas, de mulher, e por aí vai. Comecei a criar contos baseados às vezes numa frase engraçada de um deles e não parei mais. Os personagens são todos de Quintino, com nomes parecidos. Eles mesmos surpreenderam-se com os contos e hoje estão numa expectativa louca pelo lançamento do livro. Quem lê gosta muito porque está muito divertido o livro, e acho que resgatei personagens cariocas com a cara dos cariocas - afirmou Nando, sempre bem-humorado.

O Afonsinho, o Reinaldo do Atlético e o Nunes já confirmaram presença. Aí juntam com o Edu e começa a resenha (risos)".
Nando, elencando convidados para o evento, que contará com o tradicional Feijão Amigo
Nando começou a ser perseguido pela ditadura assim que foi dado o golpe militar. O início dos Anos de Chumbo redundaram na extinção do Plano de Alfabetização Nacional (PNA), de Paulo Freire, e do qual o ex-jogador era um dos professores. Estudante da Faculdade Nacional de Filosofia, passou a ser tachado de elemento "subversivo" e de "alta periculosidade", pechas estendidas à irmã Zezé, também docente e integrante do PNA.

A marcação implacável dos arapongas o fez tentar a sorte no futebol, mas as oportunidades logo tornavam-se escassas a cada clube que chegava. Integrantes do regime queimavam o filme de Nando com os dirigentes do respectivos clubes, informando-lhes das facetas criadas pelos próprios. As dispensas tornavam-se recorrentes. Passou por América, Madureira, Santos-ES, Ceará, Belenenses e Gil Vicente. No Vozão, onde chegou em 1968, aos 22 anos, viveu seu ápice como atleta. Lá, recebeu proposta para atuar no futebol português. Era o início do fim. Em terras lusitanas, à época também controladas por um regime ditatorial, de Salazar, foi comunicado de mais uma dispensa pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado. Estava claro que não se tratava de um corte esportivo.

Voltou ao Brasil, onde foi preso pelo Dops, o Departamento de Ordem e Política Social do regime militar. Durante os cinco dias, segundo Nando, ele e outros presos foram torturados impiedosamente. Ainda tentou voltar a Portugal, onde defendeu o Gil Vicente, mas pendurou as chuteiras em 1972, com apenas 26 anos. A aposentadoria, de acordo com o próprio, deu-se com o intuito de não prejudicar os irmãos.

- Eu tinha que desistir, porque o meu pavor era prejudicar a carreira deles. Mas não adiantou, porque o Edu não foi à Copa de 70 com certeza porque eu e a Zezé éramos do PNA. E Zico também foi cortado das Olimpíadas de 72 porque eu fui preso - afirmou Nando, em entrevista concedida ao Esporte Espetacular em 2011. 
Por Rio de Janeiro

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